domingo, 13 de março de 2011

12 de Março

Os políticos portugueses não sabem a sorte que têm. Se olharmos ao que aconteceu na Grécia percebemos que os portugueses são mansos, como a tia do Louçã. Os gregos partiram aquela merda toda, os portugueses aceitam qualquer merda.

Mas o dia 12 veio mostrar que afinal pode não ser bem assim. Afinal, há trezentas mil ovelhas negras que decidiram mostrar insatisfação. Tentaram várias vezes antes do dia 12 mas nunca os quiseram ouvir. Os políticos portugueses sofrem na sua grande maioria de autismo ou então por exclusão de partes, sede de poder. Ou então usam "óculos de Penafiel" que também se podem encontrar frequentemente em quadrúpedes asininos. Ou então têm sede de poder. Só alguém em perfeito estado de loucura pode pensar que está a fazer um bom serviço ao país continuar a governar da mesma forma, depois de tanto...

Mas conforme dizia, os sinais já vêm de longe. Em primeiro lugar o voto em branco e os nulos, que são obviamente um sinal de descontentamento de alguém que se dá ao trabalho de ir votar para dizer "NÃO GOSTO DE NENHUM DE VOCÊS". Mas ao longo dos tempos em que os votos dessa natureza têm vindo a subir, desvalorizados têm sido pela comunicação social e pelos políticos. Os políticos olham para o lado como quem diz, "OK, se não gostas come só as batatas" e a comunicação social dá mais valor a uma descida de meio por cento no Partido Comunista do que cinco por cento de votos em branco!!!

E os votos em branco têm mesmo vindo a subir, só nas últimas eleições foram duzentos mil. E os nulos perto de cem mil. Foram tantos votos como os votos do Partido Comunista. Se tivermos em conta os votos no Fernando Nobre e no artista madeirense que oferece submarinos ao Portas, temos um conjunto de um milhão de votantes que quiseram claramente dizer BASTA!

Mas os políticos portugueses querem tudo menos saber disso. Ouvir o Miguel Sousa Tavares dizer que a manifestação de dia 12, era algo irresponsável e inconsequente era o que outros diziam dos que lutavam pela liberdade antes do 25 de Abril e do Mandela nos tempos do apartheid.

E então fazer o quê? Perguntar aos gregos ou aos argentinos como se faz? Como se reage contra corruptos insaciáveis?

Ouvi dizer que bateram num gajo do Benfica, à porta de um restaurante no Porto. Eu acho que deviam era começar a dar umas chapadas nuns políticos para ver se eles acordam. Gastar energias a bater nos benfiquistas, especialmente quando eles já estão a onze pontos é como bater em quem já está no chão, não faz sentido. Guardem as chapadas e as bolas de golfe para os políticos, tem muito mais graça até porque uma parte deles joga golfe...

O encontro

O meu amigo Chico, habituado a outras sociedades, chegou a Cabinda. Após algum tempo de jejum, as necessidades da base da pirâmide de Maslow falaram mais alto e o Chico foi ver o que se arranjava.

Sendo o Chico um gajo de algum nível, cultural e sobretudo artístico, foi com naturalidade que aplicou a sua experiência e conhecimentos para conseguir chegar à conversa com uma senhorita...

O Chico, ao fim de algum tempo a gastar latim, falando de tantas coisas, de tantas inutilidades que ele julgava necessárias à aproximação, lá convenceu a menina a visitar os seus aposentos.

Travava a senhorita de forma elegante e galanteadora. Ao chegar aos seus aposentos ele ofereceu vinho ao que ela responde "Super Bock". Ele insiste no romance, mesmo percebendo alguma falta de sintonia.

Senta-se à viola, uma das especialidades do Chico e começa a cantar: "menina que estás à janela com o teu cabelo...."

Ela vira-se e dá a machadada final no romance do Chico: "Não faz barulho e põe novela..." Os acordes do Chico, eram afinal nocivos aos ouvidos sensíveis da menina.

Ao ouvir a história, ontem à noite, lembrei-me da música do Rui Veloso, "não se ama alguém que não ouve a mesma canção..."

Bem hajam e bom Domingo.

quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011

O urologista

As noites estavam a tornar-se cansativas. Estava a fazer um trilho desde o quarto para a casa de banho tantas eram as vezes que a bexiga me acordava durante a noite. E durante o dia tinha que andar sempre perto de uma casa de banho porque havia algo que mandava na minha agenda sanitária: a minha bexiga!

Preocupado, decidi procurar um especialista na matéria. Não sem antecipadamente ter feito umas análises ao sangue para ver a dita PSA por forma a diminuir o cagaço de um eventual cancro na próstata.

Com uma boa PSA lá fui eu ao dito urologista.

- Boa noite Dr.

- Então como está? O que o traz por cá?

Com vontade de lhe dizer que tinha ido lá ver umas enfermeiras boas, contive-me e contei-lhe a historinha toda.

- Temos que fazer umas análises e vai-se deitar ali (na marquesa) para eu o observar.

O medo do toque rectal estava a subir vertiginosamente pelas costas. Como quem saca do ás de trunfo, tirei a PSA. Sorriso vitorioso quando percebi a anuência do senhor doutor.

- pronto, as analises já não são necessárias. Mas temos sempre que o examinar.

Este "temos" ainda me deu esperança que entrasse pela porta a enfermeira boa que tinha visto à entrada. Mas pelo sim pelo não, fui refutando.

- Ó Dr.!? Então já tem a PSA e ainda precisa do toque rectal?

- Imagine que esta a comprar um carro. A PSA dá-lhe o preço mas é sempre necessário sentir o carro, ver como ele é.

Estava quase para lhe dizer que quando era pequeno me diziam que "ver era com os olhos".

- Dr. É mesmo necessário?
Pergunta idiota da minha parte.

- Já que veio até aqui deixe-me fazer o meu trabalho. Deite-se e dispa-se!

Se fosse cão, teria as orelhas caídas. Deitei-me sem roupa. O homem ia protegendo um dedo com uma espécie de preservativo, mas naquele momento aquele dedo mais me parecia um tronco. Suores frios. Olhos no tecto. Mas primeiro apalpou-me o material dizendo:

- Pénis perfeito, testículo perfeito, outro testículo perfeito.
Isto vindo da Soraia Chaves teria piada. Vindo de um gajo que está prestes a meter-me o dedo, tem uma validade muito relativa.

- Dobre os joelhos. Dói?

- Não dói Dr.

- É agradável?
O gajo seria o Ferreira Dinis? Claro que não estava a ser agradável.

- Não Dr. Não é de todo agradável.

- Agora vou-lhe tocar na próstata e é possível haja dor.

Sem mais aviso enfiou-me o dedo furiosamente. Vi pássaros, estrelas e tudo o resto que se costuma ver quando se prende o mambo no fecho das calças.

- O senhor tem uma prostatite.
Acabou o martírio mas ainda fiquei deitado com um esgar de dor durante uns bons momentos.

sábado, 8 de janeiro de 2011

Cilindrinho - A Doce Crioula

Ricardo era amigo do meu irmão Pedro. Tinha uma conversa fácil e cativante. Emanava confiança quando o assunto era animais. Gostava de explicar e exibir os conhecimentos. Conhecendo-o, rapidamente se tinha vontade de ter um cão, era um criador de Terranova, Serra da Estrela e São Bernardo, entre outros.

Como eu só gostava das raças grandes não foi difícil até ter comigo um Terranova lindo de nome Cuba. Era um cão fantástico, imponente e dócil como só os Terranova conseguem ser.

Meses passados voltei lá ao canil do Ricardo, em Santa Maria da Feira, em Março de 2003. Queria uma fêmea para o meu Terranova e na visita fui acompanhado da minha irmã Patrícia que naquela altura estava a viver comigo. Viu um São Bernardo e chamou-lhe Afonso. Não mais o largou, deitando por terra os meus planos de trazer uma fêmea.

Bom vendedor, o Ricardo ia-me dizendo que da próxima vez levas duas fêmeas. E passados alguns meses, voltei ao Ricardo, ao canil, com intenção de comprar a fêmea para o Cuba. Assim que cheguei mostraram-me uma cadelinha Cocker Spaniel que estava a amamentar dois São Bernardo, um macho e uma fêmea. O Ricardo lá ia explicando que a mãe tinha asfixiado doze das catorze crias e as que sobraram juntou-as à Cocker Spaniel para amamentar. Tinham quatro semanas e eram duas bolinhas de pelo. Fui lá com a minha namorada Lurdes, ainda mais sensível que eu. Claro que foi impossível de resistir e lá veio connosco uma fêmea São Bernardo. Chamamos-lhe Crioula.

A Crioula era uma bola de pelo, um verdadeiro peluche. Tinha todas as graças de um cão jovem, acrescidas da piada do aspecto fotográfico peluchês… Ainda por cima tinha apenas um mês o que obrigou a comprar leite de cão e uma atenção especial para com um animal que tinha sido amamentado por outra mãe. Quando se punha de pé, apoiada apenas nas patas traseiras, era frequente cair para trás, ficando toda atrapalhada.

Era um acontecimento sair com a Crioula, deixava as pessoas a olhar para ela, todas com vontade de fazer a festinha da praxe. Certo dia fui ao cinema com ela, dentro de um saco de compras. Sempre foi uma paz de alma e dormiu o filme inteiro. Fez uns chichis mas eu andava com toalhetes e limpava tudo.

A minha mãe ficou com ela quinze dias, quando fui a Cuba de férias. Chamou-lhe a “minha princesa”.

E era-o de facto, nunca vi um cão tão calmo e dócil. Nunca ladrou para ninguém nem para nada. Nem para gatos, pelo contrário: no dia em que o Peteco, um gatito, chegou à mesma casa que ela enquanto os outros cães ladraram, ela protegeu e deu de mamar. O gato dormia entre as patas dela.

Era a mãe do quintal, dava-se bem com todos os cães, e adorava carinhos. Fazia qualquer coisa por um carinho e só havia mais uma coisa que ela gostava tanto como carinhos, sendo essa coisa bananas. Sentia o cheiro à distância, e vinha a correr a pedir a sua banana. Para pedir, quer os carinhos, quer outra coisa qualquer, tinha um latir que mais parecia um ronronar. Um ronronar doce e meigo. Toda ela era meiguice.

Foi crescendo e certo dia apareceu com uma ferida no nariz. Foram quatro anos a tentar curar a ferida. Cremes, antibióticos, colar isabelino, às resmas… Nada funcionou. Nessa altura conheci o Marcelo, veterinário fantástico, com um saber e uma competência como nunca vi. Ajudou-me muito a cuidar da cadela mais meiga do mundo.

Mas afinal as feridas tinham uma razão extra para existir, um cancro mamário. Conforme foi crescendo, o Marcelo foi-me dizendo que não havia solução, que mais tarde ou mais cedo havia que tomar uma decisão. Mas a Crioula andava feliz, sempre andou. Nunca ganiu, nunca latiu. Apenas ladrava baixinho ou ronronava alto para pedir alguma coisa.

Era uma paz… Um doce…

O cancro cresceu e certo dia atingiu cerca de 40 cm. Estava enorme. Tinha chegado o dia de tomar a decisão. Preparou-se tudo, mandou-se vir o medicamento da eutanásia mas nada fazia prever que em menos de 9 dias, tudo se tivesse precipitado.

A Crioula começou com ataques epilépticos e começou a tomar Valium. E a eutanásia não chegava, ainda faltava uma semana para chegar. Em Cabinda, nada a fazer senão esperar. Mas ela continuava feliz, a comer banana e a abanar a cauda sempre que recebia um carinho. Até que há três dias atrás aconteceu, a bolsa do tumor rebentou. E o cheiro a podre apoderou-se do quintal. E a eutanásia não chegava.

Hoje a eutanásia chegou, após três dias a gerir a situação, a limpar a Crioula porque ela já não se mexia para fazer as necessidades. Já não abanava o rabo. Felizmente ainda queria banana desde que dada na boca. Ainda bem para poder dar-lhe os sedativos, dentro das bananas.

Havia que encontrar a veia e administrar a eutanásia. A triste verdade é que não consegui. Não fui capaz de meter a agulha na veia inviabilizando a hipótese de dar à minha doce cadela uma morte em paz. Ao fim de duas horas a tentar, extenuado e em choque, desisti. E a Criolinha já não queria banana, pela primeira vez na vida. Ela que adorava banana.

A solução era o abate com um tiro. E assim foi.

Ao contrário das outras vezes, em que metia a cabeça de fora e a sua grande língua a babar-me os vidros e os bancos do carro, desta vez foi deitada, neste último passeio. Com olhar triste antagonizando com o olhar feliz que o meu cilindrinho tinha habitualmente.

Talvez de forma premonitória, chorou duas vezes antes de morrer. Foi a primeira vez nos seus 8 anos de vida, que ouvi chorar. Consumado o horrível abate, que nunca esquecerei na vida mesmo que venha a sofrer de Alzheimer, chorei. Chorei porque me lembrei dela aos saltos atrás de mim a pedir banana. Era como um cilindro, de tão gordinha que era. Chorei pela morte horrível que teve, pelo sofrimento que teve antes da morte. Chorei por ter sido incompetente na colocação do cateter. Há muito que não chorava tanto.

Matei hoje a Crioula e com ela vão momentos únicos de carinho e amor incondicional. Dói tanto que não consigo explicar o que sinto.